"Que sei eu do presente, salvo que ele é já o
futuro?" disse Fernando Pessoa. É sempre difícil traçar um retrato do que
se passou ao longo de um ano, pois a memória é demasiado selectiva.
Findo o capítulo deste longo livro, já na contracapa
uma imagem: dois pratos na balança. De um lado o bom, do outro antes pêlo
contrário. Escrever o epitáfio é fácil. Estranhamente [ou talvez não] foi bem
diferente do epílogo. Tenho apenas a vaga ideia que começou com grandes
expectativas que em parte foram goradas. Talvez a ideia de começar algo novo
seja isso sim verdadeiramente estimulante. O leitmotiv para o que se avizinhava.
Tivesse eu o mapa do céu e outro horizonte teria sido. Não o longo Inverno que
se propagou noite e dia, enegrecendo inclusive a beleza da escuridão da noite.
Não ouve estrelas, cometas ou estrelas cadentes. Apenas um longo sussurro invernal,
um vento que empurrava constantemente a janela e levantava as folhas caídas num
manto de tons terra.
Peguei
na caneta e imaginei as “famous last words”para dar algum sentido ao texto: “Aqui
jaz quem já não esteve”. Podia citar Almada Negreiros, mas ele ainda consegue
ser mais cáustico do que eu. Talvez uma frase do príncipe Hamlet, com toda a
sua raiva opressiva. Maquiavel ou um pouco da razão de Kant? Talvez mesmo não.
Talvez me falta a arte de me esgueirar pelo inconsciente e imaginar algo mais
do que um conjunto de frases desabitadas.
Seria fácil desenhar meia dúzia de palavras: Bom Ano
Novo 2016 e 365 anos mais um, de amor, felicidade, arco-íris e coisas
celestiais. Mas a realidade é bastante mais complexa do que desejar algo tão
positivo e abstracto, por entre nuvens e uma névoa que me tolda a imaginação. Tivesse
eu o mapa das nuvens, colocaria na agenda um sol, um lugar numa carruagem que cruza
a paisagem como o pincel numa tela de aguarela. No fim, um pedestal com um polícia
sinaleiro para me indicar a saída da encruzilhada em que vim parar.
Resta-me
desejar que o futuro não tropece em todas as madrugadas que tem a noite. Que
continue a sorrir para quem sorri, continue a dar a mão a quem pede, e ter
sempre uma palavra de conforto para quem me ouve ou lê. O resto será apenas a
areia do tempo a descer pela ampulheta de vidro e um café, sentado numa esplanada
enquanto capturo uma imagem de quem imagino mas não conheço.
Como
disse Pessoa “passado este, há um virar de página e a história contínua, mas
não o texto.”
Que 2016 seja um ano em que possa escrever com redobrado prazer, pois o passado é ontem, e o futuro ainda não sei por onde…
Que 2016 seja um ano em que possa escrever com redobrado prazer, pois o passado é ontem, e o futuro ainda não sei por onde…