PS: a imagem que se segue pode ferir ou provocar ardor a alguns contribuintes mais susceptíveis...
Acabado de aterrar em Portugal no aeroporto de Beja (a viagem mais barata que encontrei para sair de Heathrow!) veio-me à ideia o porquê de construírem um aeroporto em pleno deserto de searas e olivais regados. Estranhei o facto de não existir gente que se preze na fronteira terrestre, nem um follow-me que se dignasse a dirigir o avião à manga que também não existia, aliás não vi nenhuma alma, apenas um rebanho de ovelhas pastoreava o restolho.
Depois de meia hora à espera de uma mala que tardava a chegar à passadeira que não rolava, enfrentei nova fila na esperança de alugar um táxi que me levasse até Lisboa (o meu destino final). Cansado de esperar fiz-me à estrada, e percorri a terra sonâmbula durante algumas horas.
Passado o desnorte por tudo o que me aconteci [já para não mencionar o jet lag na inteligência!] lá consegui entrar numa carruagem vazia que circulava no metro do Porto. Fiquei atónito. Depois de vir apertado no avião com tantas cadeiras vazias, mais uma dezena de lugares à escolha cada um com melhor vista para o granito em que se transformara a minha decepção. Ainda pensei que fosse feriado, enquanto olhava as ruas apinhadas de vultos assombrados que desciam a Rua de Santa Catarina.
Chegado à estação do Poceirão entrei no café da aldeia para uma bucha rápida e pedi uma bica e uma empada de galinha. Estava com um aspecto absolutamente convidativo.
Sentei-me no balcão e olhei para a pequena televisão com box da Meo. Lá estava ele,o rapaz com um ar austero. Disse com um tom perturbado: "Portugueses, boa noite"
….o resto já se sabe!
Estarei eu no local errado à hora errada ou foi imaginação minha? Não. Decididamente não devia ter pedido a bica e a empada de galinha.
Refeito do murro do estômago, continuei estrada fora, e depois de alguma hesitação entre entrar em Lisboa via SCUT ou a nado, optei pela entrada norte via Ponte Vasco da Gama. Tenho um primo que é portageiro lá e consegue umas borlas. Dito e feito. Cheguei a casa tarde mas a senhoria não deu por mim. Óptimo.Mais uns dias de alívio antes de vir pedir o pagamento da renda.
Hoje manhã cedo, o rádio acordou-me com as noticias frescas do dia anterior. Uma multidão de resignados e indignados foi fazer truka para as escadas da Assembleia da República e entre megafones e cartazes, ouviram-se pregões de outros tempos. Ainda pensei que estivesse a sonhar com o PREC, mas não. Parece que se tratou de uma plataforma multinacional,multipartidária de gente diversa e algumas caras conhecidas, que devido a um aumento de capital passaram de geração rasca a mais prosáicos indignados. Maldita empada de galinha, antes um prego com uma imperial, isso ou um pedido de desculpas do Primeiro-Ministro pelo meu enjoo, que se mantém, apesar do kompensan.
Não bastasse má fortuna de este ano ter meio Natal, nos próximos dois anos alguns de nós não têm Natal de todo, nem férias no Allgarve ou lado algum. Aliás não têm nada, só aumento de impostos. Os que talvez tenham Natal e/ou férias vão trabalhar mais meia hora por dia, e dizem que isso vai contribuir decididamente para o aumento da produtividade e compensar a descida da TSU.Acreditamos sinceramente com toda a fé. É nisso e no Pai Natal.
Ainda não imaginei o alcance da tal meia hora, nem o alcance dos 3 mil milhões que o Governo não vai gastar com a cativação dos subsídios (politicamente falando trata-se da tal redução da despesa pública que todos os sectores da vida pública exigiam; querem cortes na despesa, ei-los!).
Mas não deixa de ser coincidência esta conversa de milhões ter algumas dissemelhanças com aqueles primeiras notícias do buraco do BPN que não iria afectar de todo o Estado ou os particulares. Em suma, a velha conversa fiada de sempre do cú com as calças. Juro. Qualquer coincidência entre as temas é tão ficção como a dívida encapotada do Sr. Alberto.
Depois de algumas águas do Castello [passe a publicidade], ainda mal refeito da maldita empada lá ganhei coragem e enfiei a família no centro comercial a passear o cão nas montras e aproveitara borla do ar condicionado. Eu não sai, nem para aproveitar o desconto na Repsol. Estou a tentar poupar para os cortes e acréscimos que ai vêem, tem de ser. Alguém tem que pagar as energias renováveis, alguém tem que tapar o estranho [???] défice energético da EDP.
Core tier 1. Gosto deste estrangeirismo. Faz-me lembrar gravatas e bancos. Eu acho é que eles não gostam nem do termo, nem da solução, nem dos 12 mil milhões de euros que andam para aí! É como o programa de emergência social, tem o mesmo saboramargo que as medidas do défice que ele não pariu.
Perguntam: "Como foi possível acumular tantos erros e acumular tantos prejuízos?". Fácil!. Não existe moldura penal para punir os culpados. Mas também não parece existir grande vontade de a formular.
Eu devia sair, parece que os combustíveis vão aumentar 1 a 2 cêntimos amanhã. Volto já.
lembrei-em agora que deixei o casaco no aeroporto. Sabiam que o aeroporto de Beja foi projectado para estimativa de um milhão de passageiros em 2015 e nos primeiros 4 meses de funcionamento apresenta o curioso número de 44 voos com um média de 18,1 passageiros/voo. Custou a módica quantia de 33 milhões de euros e uns cêntimos de ilusão. Ora aí está uma boa forma de o nosso Ministro da Ignomínia sair da toca onde se arrependeu, e apresentar uma boa alternativa para aqueles barracões. É uma pena, a paisagem em redor até é bonita, um bocado diferente dos casas desarrumados de Camarate. A sério.
Depois de meditar sobre a empada de galinha cheguei a uma conclusão óbvia sobre o momento periclitante que vivemos, ouçamos a minha Lição de Sapiência:
- Não é pelo facto do Isaltino preencher requerimentos atrás de requerimentos no Tribunal Constitucional para protelar a sua prisão, que o Alberto vai deixar de ensaiar números de circo ou que o Sr. Coelho vai deixar de andar com a vassoura atrás a fazer figura de parvo.
- E também não é pelo facto de estarmos a presenciar o maior roubo desde a queda da monarquia que o Comendador vai arranjar um pavilhão na Plataforma Logística do Poceirão para armazenar a sua colecção de Arte Moderna.
O problema é que, em vez de uma empada de galinha e um café devia ter pedido a sopa do dia que ficava mais barato. Isso sim.
Mas confesso. Fiquei com o coração desfeito [ainda tenho!] ao ouvir o bispo vermelho emérito D. Martins a profetizar uma espécie de apocalipse agora com manifestações, rebentamentos e sangue. Descansei quando fui reler o Canto IV dos Lusíadas. O D. Martins peca pelo exagero da figura de rastilho que emprega na sua crónica. O Velho do Restelo é que tinha razão, ainda que a espaços, fique com impressão que até o Velho do Restelo nos dias de hoje é bem mais optimista do que o nosso Ministro da Fazenda ou o responsável pela redacção dos discursos do Primeiro-ministro.
Depois de um café em casa [aproveitando o facto do IVA ainda não ter subido decidi comprar um carrinho de compras do lote arábica e timor à loja do Sr. Belmiro que dá super descontos aos tansos e entrega os impostos na Holanda para fugir ao fisco português; gesto patriótico] retemperei a boa disposição pelas páginas dos jornais e descobri coisas tão desinteressantes como as personagens do Secret Story ou o Peso Pesado [pausa para vomitar!]:
- Para além de existirem 99% de indignados a esta hora em Wall Street, parece que há um antigo secretário de Estado responsável por um negócio ruinoso de 600 milhões de euros com uma construtora e curiosamente está neste momento na Comissão de Obras Públicas. Más-línguas! - pensei.
- Foi descoberto um buraco de 200 M€ no Fundo de Pensões dos Trabalhadores do Santander-Totta resultado de algumas operações em fundos de futuros. Trocos!- retorqui.
Pior do que a digestão da empada de galinha, é imaginar que afinal de contas surreal é imaginar que isto tudo se resolve com meia hora a mais de trabalho ou cortar nas prendas das miúdos e nas férias no areal. A solução é continuar a filosofar, nem que seja com croissants.
Como diria o Mário Zambujal, longe daqui é que se está bem. Piores dias nos esperam.
Post-morten: desenganem-se aqueles que pensam que calças com boca-de-sino e colarinhos do tamanho de asa do avião estão fora de moda, com orçamentos familiares da década de 70 e encargos de séc. XXI, haja coragem para voltar a usar sapatos de tacão alto para elevar o ânimo. E vivam as marmitas.