25/10/2011

..o Jardim das Delícias Terrenas



...tal e qual. Não um simples Stenway & Sons em plena de queda de graves, mas antes um partitura completa de eventos numa simultaneidade que deixa pouca margem para qualquer tipo de manifestação de alívio. De repente o décor que transfigurava a cena em palco, transforma-se numa réplica do Jardim das Delícias Terrenas (do saudoso Bosch) em que na ténue linha que separa o eliseu imaginado caminha agora vagarosamente uma personagem com o semblante toldado pela dúvida. Que passo dar, que rumo seguir?




Demasiadas dúvidas, incertezas que esmagam qualquer expectativa. A longa espera que incinera o ânimo arrastado pelas gotas que do céu caiem, como lágrimas de uma tragédia imaginada.




Talvez ainda não sejam os dias do fim, mas antes o princípio de fim de uma história. O tempo o dirá.



photo by: KVirtanen








20/10/2011

...simbiose de talentos


Straight from the Heart from Teresa Vila Verde on Vimeo.


...adorei Teresa! Superou as minhas melhores expectativas! Dar-vos os parabéns é pouco...tem tudo! a performance servida sobre a forma de autobiologia em que a arte se despe e expõe, de forma crúa, bela e única. Espero que esta seja a primeira de muitas simbioses com a Sofia, encantadora de olhares. O toque da Sofia traz ainda mais poesia à imagem. Palmas de pé. Bravo.

16/10/2011

…uma empada & uma bica sf.f.



PS: a imagem que se segue pode ferir ou provocar ardor a alguns contribuintes mais susceptíveis...

Acabado de aterrar em Portugal no aeroporto de Beja (a viagem mais barata que encontrei para sair de Heathrow!) veio-me à ideia o porquê de construírem um aeroporto em pleno deserto de searas e olivais regados. Estranhei o facto de não existir gente que se preze na fronteira terrestre, nem um follow-me que se dignasse a dirigir o avião à manga que também não existia, aliás não vi nenhuma alma, apenas um rebanho de ovelhas pastoreava o restolho.

Depois de meia hora à espera de uma mala que tardava a chegar à passadeira que não rolava, enfrentei nova fila na esperança de alugar um táxi que me levasse até Lisboa (o meu destino final). Cansado de esperar fiz-me à estrada, e percorri a terra sonâmbula durante algumas horas.

Passado o desnorte por tudo o que me aconteci [já para não mencionar o jet lag na inteligência!] lá consegui entrar numa carruagem vazia que circulava no metro do Porto. Fiquei atónito. Depois de vir apertado no avião com tantas cadeiras vazias, mais uma dezena de lugares à escolha cada um com melhor vista para o granito em que se transformara a minha decepção. Ainda pensei que fosse feriado, enquanto olhava as ruas apinhadas de vultos assombrados que desciam a Rua de Santa Catarina.

Chegado à estação do Poceirão entrei no café da aldeia para uma bucha rápida e pedi uma bica e uma empada de galinha. Estava com um aspecto absolutamente convidativo.

Sentei-me no balcão e olhei para a pequena televisão com box da Meo. Lá estava ele,o rapaz com um ar austero. Disse com um tom perturbado: "Portugueses, boa noite"

….o resto já se sabe!

Estarei eu no local errado à hora errada ou foi imaginação minha? Não. Decididamente não devia ter pedido a bica e a empada de galinha.

Refeito do murro do estômago, continuei estrada fora, e depois de alguma hesitação entre entrar em Lisboa via SCUT ou a nado, optei pela entrada norte via Ponte Vasco da Gama. Tenho um primo que é portageiro lá e consegue umas borlas. Dito e feito. Cheguei a casa tarde mas a senhoria não deu por mim. Óptimo.Mais uns dias de alívio antes de vir pedir o pagamento da renda.

Hoje manhã cedo, o rádio acordou-me com as noticias frescas do dia anterior. Uma multidão de resignados e indignados foi fazer truka para as escadas da Assembleia da República e entre megafones e cartazes, ouviram-se pregões de outros tempos. Ainda pensei que estivesse a sonhar com o PREC, mas não. Parece que se tratou de uma plataforma multinacional,multipartidária de gente diversa e algumas caras conhecidas, que devido a um aumento de capital passaram de geração rasca a mais prosáicos indignados. Maldita empada de galinha, antes um prego com uma imperial, isso ou um pedido de desculpas do Primeiro-Ministro pelo meu enjoo, que se mantém, apesar do kompensan.

Não bastasse má fortuna de este ano ter meio Natal, nos próximos dois anos alguns de nós não têm Natal de todo, nem férias no Allgarve ou lado algum. Aliás não têm nada, só aumento de impostos. Os que talvez tenham Natal e/ou férias vão trabalhar mais meia hora por dia, e dizem que isso vai contribuir decididamente para o aumento da produtividade e compensar a descida da TSU.Acreditamos sinceramente com toda a fé. É nisso e no Pai Natal.

Ainda não imaginei o alcance da tal meia hora, nem o alcance dos 3 mil milhões que o Governo não vai gastar com a cativação dos subsídios (politicamente falando trata-se da tal redução da despesa pública que todos os sectores da vida pública exigiam; querem cortes na despesa, ei-los!).

Mas não deixa de ser coincidência esta conversa de milhões ter algumas dissemelhanças com aqueles primeiras notícias do buraco do BPN que não iria afectar de todo o Estado ou os particulares. Em suma, a velha conversa fiada de sempre do cú com as calças. Juro. Qualquer coincidência entre as temas é tão ficção como a dívida encapotada do Sr. Alberto.

Depois de algumas águas do Castello [passe a publicidade], ainda mal refeito da maldita empada lá ganhei coragem e enfiei a família no centro comercial a passear o cão nas montras e aproveitara borla do ar condicionado. Eu não sai, nem para aproveitar o desconto na Repsol. Estou a tentar poupar para os cortes e acréscimos que ai vêem, tem de ser. Alguém tem que pagar as energias renováveis, alguém tem que tapar o estranho [???] défice energético da EDP.

Core tier 1. Gosto deste estrangeirismo. Faz-me lembrar gravatas e bancos. Eu acho é que eles não gostam nem do termo, nem da solução, nem dos 12 mil milhões de euros que andam para aí! É como o programa de emergência social, tem o mesmo saboramargo que as medidas do défice que ele não pariu.
Perguntam: "Como foi possível acumular tantos erros e acumular tantos prejuízos?". Fácil!. Não existe moldura penal para punir os culpados. Mas também não parece existir grande vontade de a formular.

Eu devia sair, parece que os combustíveis vão aumentar 1 a 2 cêntimos amanhã. Volto já.

lembrei-em agora que deixei o casaco no aeroporto. Sabiam que o aeroporto de Beja foi projectado para estimativa de um milhão de passageiros em 2015 e nos primeiros 4 meses de funcionamento apresenta o curioso número de 44 voos com um média de 18,1 passageiros/voo. Custou a módica quantia de 33 milhões de euros e uns cêntimos de ilusão. Ora aí está uma boa forma de o nosso Ministro da Ignomínia sair da toca onde se arrependeu, e apresentar uma boa alternativa para aqueles barracões. É uma pena, a paisagem em redor até é bonita, um bocado diferente dos casas desarrumados de Camarate. A sério.

Depois de meditar sobre a empada de galinha cheguei a uma conclusão óbvia sobre o momento periclitante que vivemos, ouçamos a minha Lição de Sapiência:

- Não é pelo facto do Isaltino preencher requerimentos atrás de requerimentos no Tribunal Constitucional para protelar a sua prisão, que o Alberto vai deixar de ensaiar números de circo ou que o Sr. Coelho vai deixar de andar com a vassoura atrás a fazer figura de parvo.

- E também não é pelo facto de estarmos a presenciar o maior roubo desde a queda da monarquia que o Comendador vai arranjar um pavilhão na Plataforma Logística do Poceirão para armazenar a sua colecção de Arte Moderna.

O problema é que, em vez de uma empada de galinha e um café devia ter pedido a sopa do dia que ficava mais barato. Isso sim.

Mas confesso. Fiquei com o coração desfeito [ainda tenho!] ao ouvir o bispo vermelho emérito D. Martins a profetizar uma espécie de apocalipse agora com manifestações, rebentamentos e sangue. Descansei quando fui reler o Canto IV dos Lusíadas. O D. Martins peca pelo exagero da figura de rastilho que emprega na sua crónica. O Velho do Restelo é que tinha razão, ainda que a espaços, fique com impressão que até o Velho do Restelo nos dias de hoje é bem mais optimista do que o nosso Ministro da Fazenda ou o responsável pela redacção dos discursos do Primeiro-ministro.

Depois de um café em casa [aproveitando o facto do IVA ainda não ter subido decidi comprar um carrinho de compras do lote arábica e timor à loja do Sr. Belmiro que dá super descontos aos tansos e entrega os impostos na Holanda para fugir ao fisco português; gesto patriótico] retemperei a boa disposição pelas páginas dos jornais e descobri coisas tão desinteressantes como as personagens do Secret Story ou o Peso Pesado [pausa para vomitar!]:

- Para além de existirem 99% de indignados a esta hora em Wall Street, parece que há um antigo secretário de Estado responsável por um negócio ruinoso de 600 milhões de euros com uma construtora e curiosamente está neste momento na Comissão de Obras Públicas. Más-línguas! - pensei.

- Foi descoberto um buraco de 200 M€ no Fundo de Pensões dos Trabalhadores do Santander-Totta resultado de algumas operações em fundos de futuros. Trocos!- retorqui.

Pior do que a digestão da empada de galinha, é imaginar que afinal de contas surreal é imaginar que isto tudo se resolve com meia hora a mais de trabalho ou cortar nas prendas das miúdos e nas férias no areal. A solução é continuar a filosofar, nem que seja com croissants.

Como diria o Mário Zambujal, longe daqui é que se está bem. Piores dias nos esperam.

Post-morten: desenganem-se aqueles que pensam que calças com boca-de-sino e colarinhos do tamanho de asa do avião estão fora de moda, com orçamentos familiares da década de 70 e encargos de séc. XXI, haja coragem para voltar a usar sapatos de tacão alto para elevar o ânimo. E vivam as marmitas.

13/10/2011

...estais cegos!

Príncipes, Reis, Imperadores, Monarcas do Mundo: vedes a ruína dos vossos Reinos, vedes as aflições e misérias dos vossos vassalos, vedes as violências, vedes as opressões, vedes os tributos, vedes as pobrezas, vedes as fomes, vedes as guerras, vedes as mortes, vedes os cativeiros, vedes a assolação de tudo? Ou o vedes ou o não vedes. Se o vedes como o não remediais? E se o não remediais, como o vedes? Estais cegos. Príncipes, Eclesiásticos, grandes, maiores, supremos, e vós, ó Prelados, que estais em seu lugar: vedes as calamidades universais e particulares da Igreja, vedes os destroços da Fé, vedes o descaimento da Religião, vedes o desprezo das Leis Divinas, vedes o abuso do costumes, vedes os pecados públicos, vedes os escândalos, vedes as simonias, vedes os sacrilégios, vedes a falta da doutrina sã, vedes a condenação e perda de tantas almas, dentro e fora da Cristandade? Ou o vedes ou não o vedes. Se o vedes, como não o remediais, e se o não remediais, como o vedes? Estais cegos. Ministros da República, da Justiça, da Guerra, do Estado, do Mar, da Terra: vedes as obrigações que se descarregam sobre vosso cuidado, vedes o peso que carrega sobre vossas consciências, vedes as desatenções do governo, vedes as injustças, vedes os roubos, vedes os descaminhos, vedes os enredos, vedes as dilações, vedes os subornos, vedes as potências dos grandes e as vexações dos pequenos, vedes as lágrimas dos pobres, os clamores e gemidos de todos? Ou o vedes ou o não vedes. Se o vedes, como o não remediais? E se o não remediais, como o vedes? Estais cegos.

Padre António Vieira, in "Sermões"

09/10/2011

...a relatividade de Escher


Produtividade, S.A.

A certa altura podemos questionar se o facto de na Constituição indicar que o SNS é universal e tendencialmente gratuito (idem para a Educação), impede que alguns serviços não possam a ser comparticipados. Aparentemente, é o que está previsto vir a acontecer. Isso não implica que a Constituição tenha de ser alterada, aliás, uma coisa que a Constituição não prevê nem aponta é para a continuação dos desperdícios, isso sim é que é lamentável

A Constituição matematicamente falando define conceitos abrangentes, médias, máximos denominadores comuns, e o diabo a quatro. Num país onde abundam, livros brancos, livros verdes, recibos verdes que eram azuis e agora são electrónicos, nuns pais já tudo foi estudado, e o que não foi estudado necessita de ser repensado, é caso para dizer, crie-se uma comissão para estudar o caso. Ou então mude-se a constituição, que apesar de sermos uma democracia imberbe, já foi modificada 7 vezes!

O motivo atendível foi uma espécie de persona non grata do famoso programa de Constituição que o PSD pretendia ver discutidas. Depois de enxovalhada na praça pública, e envergonhadamente colocada na gaveta, o Governo volta à carga com algo bem mais maquiavélico, a falta de produtividade e a inadaptação ao posto de trabalho. Todos sabemos que se há conceito abstracto e ardiloso, é a adopção de metas de produtividade.

Tomemos por exemplo o Sr. X que trabalha no Cemitério de A-dos-Aflitos. O sr. X consegue aviar 5 clientes/dia (abertura da cova com enxada, entrada do caixão com auxílio de corda de nylon já com algumas emendas e cobertura final com terra e acabamento final). A câmara municipal de A-dos-Aflitos vê-se compelida a privatizar o serviço público que providenciava (devido a uma alínea do acorda da Troika) e transfere essas competências para a empresa privada de um primo da secretária de vereador do urbanismo da Câmara Municipal. Mudança radical de paradigma. A nova empresa estabelece que o Sr. X para rentabilizar todos os encargos e gerar uma margem que proteja o corpo accionista, necessita processar 8 clientes/dia e vê o seu horário reduzido em duas horas por dia, bem como o ordenado que leva ao fim do mês cuidadosamente aliviado na mesma proporção. Mas nem tudo é mau para o Sr. X. A nova entidade gestora oferece agora um seguro de saúde, para o qual é descontado parte do ordenado do Sr. X (até pode descontar mais tarde no IRS!!) e assim, deixa de ser necessário faltar ao período da manhã para ir para a bicha que se forma à entrada do centro de saúde À espera de uma consulta d urgência ou para uma marcação de uma consulta para um dos dois médicos de família que ainda dão consultas. O Centro de Saúde deve fechar nos próximos meses, estando os serviços a ser concentrados no hospital distrital que fica a 54 km. Já ali, mas antes há que atravessar a serra pela estrada municipal que não vê obras de reabilitação desde o século passado. O sr. X só tem motivos para sorrir e aumentar a sua produtividade. Tem é que despachar 8 clientes.

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Madeira shaken, not stirred

Hoje há eleições na Madeira. A Madeira é uma ilha, ou antes um arquipélago. Aparentemente tem um buraco. Em termos matemáticos o Buraco nas contas da Madeira é qulquer coisa como o buraco da empresa pública REFER. No caso da REFER, por norma, quaisquer desvios e gastos excessivos são imputados aos maquinistas e em menor proporção aos vendedores de bilhetes (estes pelo facto de serem invariavelmente antipáticos!). No caso da Madeira, será difícil apontar bodes expiatórios, pois a haver “não renovações ou reformas compulsivas” seria necessário um comboio humanitário de milhares de madeirenses para o Continente (que ninguém quer!) ou então preparar as ilhas desertas para albergar uns quantos milhares de pessoas, incluído o chefe da banda e o director do Jornal da Madeira. Também há a opção de alugar uns quantos barcos a remos ou reduzir para metade as tarifas aéreas da para a América Latina. Ainda assim penso que a melhor opção é mesmo deixar os madeirenses resolver o seu problema…mas com os devidos cortes nas transferências do Continente por forma a contrabalançar essa aptidão irascível para gastarem mais do que podem e devem.

PS: alguém acha normal as empresas públicas madeirenses transportar eleitores em dia de eleições? Se existe alguém atirem-lhe a primeira pedra!

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A importância de se chamar Álvaro

Temos a felicidade de ter um Ministro simpático da pasta da Economia que se chama Álvaro. Apenas Álvaro e não mais do que Álvaro. Não foi escolhido pelo facto de ter editado um livro “Portugal, na Hora da Verdade (Gradiva, 2011), passe a publicidade mas porque tem um je ne sais quoi de Steve jobs da economia: visionário e sanguinário, e alguns apóstolos no Conselho de Ministros.

“Na política de transportes quase tudo terá de mudar” dixit. Só foi pena ter-se esquecido do Plano Estratégico dos Transportes em casa e ter vindo com a famosa conversa do 31 de boca. Mas adiante. Concordo com todas as opções tomadas, mais fusão menos fusão a confusão, desde que se acabe com a confusão nos transportes e com as regalias injustificadas. A parte triste da história é mesmo não existir desde a década de 80 do século passado uma abordagem séria aos transportes em Lisboa e Porto bem como no resto do País. É que pode não parecer mas Portugal também é para lá de Lisboa e Porto.

Conselho: amigo Álvaro da próxima deixe as cópias a cores do power-point e leve o Ipad, de certeza que vai fazer um figurão. Desta fez fez apenas má figura.

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Manif

…eu queria falar sobre as manifestações violentas de hordas de hunos da CGTP-IN e alguns UGT disfarçados de avó da capuchinho vermelho mas o Alberto João Jardim entrou aqui na redacção e disse que “Não queremos comunas aqui!…». Fica para uma outra oportunidade quando o Alberto João estiver a enxovalhar os deputados da oposição e o Presidente Cavaco no quarto de hotel a ver o Panda Biggs.

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Paradoxo de Escher

Este holandês apaixonado pela matemática foi mestre na criação de realidades impossíveis. Da mesma forma com a mesma argúcia, o nosso Governo está refinado na desconstrução de toda a lógica socialista das últimas décadas e paulatinamente tem vindo a criar a realidade utópica e insustentável de sobrepor na mesma receita: recessão e crescimento económico. Falar em cortes, sobrecarregar a carga fiscal restringir o crédito e desincentivar o consumo é tão benéfico para economia como um chapéu-de-chuva em pleno deserto. Aliás, o chapéu ainda faz alguma sombra…