25/09/2021

...confortos de alma

 

..se há coisa que me entusiasma é acordar a um certo dia e pensar que daqui a umas horas vou utilizar a caneta para fazer umas cruzes bem bonitas nos quadradinhos sem exceder os limites legais da geometria. Um mísero detalhe que encerra o quão importante passo a ser a partir desse momento, para o equilíbrio do ecossistema político. Por um voto se ganha ou perde, e o gasto em tinta até é supérfluo; comparativamente, o estrago que a escolha pode ter, poderá ter outras incidências geométricas. Por sinal, nesta campanha [tal como tinha sucedido com as anteriores] o nível de discussão foi tão avassalador, tão rico que estou muito inclinado a daqui a quatro anos, propor-me como putativo candidato à Junta de freguesia de um ilhéu nas Desertas, ou quem sabe a algo mais ousado, presidente da Câmara do Ilhéu das Cabras. Uma boa hipótese para um futuro salto para uma aventura mais internacional (sempre fica mais perto de Washigton!).

Não é por nada, mas seria um passo decisivo para a minha afirmação como cidadão interventivo, pró-activo e defensor acérrimo da causa pública. As vantagens seriam mais do que evidentes para todos nós. Por um lado, seria uma forma de descentralizar forma objectivamente específica e factual contraindo a tese que muito se fala mas pouco se concretiza.

Por outro, seria uma forma de rentabilizar de forma segura e transparente o investimento que costuma aparecer de forma simpática no orçamento europeu na sub-secção territórios insulares, mas que normalmente serve para construir hotéis ou cais de acostagem para paquetes de luxo. Ora, quer o Ilhéu das Cabras quer o Ilhéu Deserta Grande, apesar de constituírem excelentes portos de águas profundas, apresentam, características interessantes para a acostagem de embarcações de grande porte que não excedam o tamanho de um bote de borracha.



Outra das promessas que penso constar no manifesto eleitoral que está em reanálise, será a descarbonização de toda a economia local, pela implementação de ninhos em material reciclável para toda a avifauna marinha e a redução da emissão de gases de escape (os botes só poderão acostar se movidos à força de braços ou vela).

Dado que sou uma pessoa de bem, é minha intenção tornar o território livre de armas, em especial bazucas, espingardas ou pistolas de forminantes. Fiquemo-nos pelas atoardas deselegantes vinda de onde vierem, sobretudo dos meus futuros opositores políticos. No máximo serão toleradas fisgas ou arremessos de lava solidificada que por lá não faltam.

Não contem comigo para autocolantes, canetas ou chapéus e bandeirinhas em corsos circenses sob aplausos. Contem comigo para obra feita, nem que sejam umas rotundas ali ou acolá.

Penso que este conjunto de medidas, será mais do que suficiente para assegurar um futuro mais risonho para colocar qualquer uma destas parcelas do território na senda do desenvolvimento sustentado.

Mas amanhã vou mesmo votar primeiro, depois logo se vê. 

20/09/2021

…sem título



 Em meus momentos escuros

Em que em mim não há ninguém,

E tudo é névoas e muros

Quanto a vida dá ou tem,


Se, um instante, erguendo a fronte

De onde em mim sou soterrado,

Vejo o longínquo horizonte

Cheio de sol posto ou nado,


Revivo, existo, conheço;

E, ainda que seja ilusão

O exterior em que me esqueço,

Nada mais quero nem peço:

Entrego-lhe o coração.


(Fernando Pessoa

19/09/2021

..bas fond

 ...passada quase uma semana desde o início da campanha eleitoral confesso que não tive tempo suficiente para aprofundar com a devida subjectividade as diferentes propostas eleitorais que me têm sido presenteadas. Ainda assim, ficou-me já gravado na retina a riqueza e originalidade de um dos temas mais interessantes da campanha [desconfio que se vai prolongar até à noite eleitoral]: a bazuca. O discurso bélico e buliçoso é o máximo denominador comum de quase todos os discursos, facto que demonstra o bas fond da nata política (reflexo da sociedade?). Aliás, se retirarmos do discurso a tríade mágica: o PPR, as promessas de dinheiro fresco para quem votar no partido que está no poder e os novos investimentos que vão ser realizados, mas que curiosamente já lá constavam em anteriores campanhas, ainda assim, ficamos com um conjunto apreciável de boas ideias e iniciativas louváveis [ver detalhe de algumas delas na imagem infra]. Em suma um manancial que se extingue até ao ponto de aridez absoluta.

Aliás a melhor forma de avaliar o quão sublime é o paradoxo deste exercício eleitoral, é tentar interpretar de forma quase clínica a objectividade de algumas coligações eleitorais que ora se digladiam até à morte na arena, para no concelho vizinho estarem unidas de facto até que a morte as separe contra um suposto inimigo comum, que por sinal será o vizinho amado já ali ao lado. O que me espanta é que há pouca gente a dar por isso e interrogo-me se não há aqui uma falha qualquer de percepção ou então um excesso de indiferença.

Nota de auto-flagelação: votar foi em tempos, um exercício agradável, sobretudo quando o discurso e os oradores tinham o dom da palavra e um sentido nobre da causa pública [os resultados é que nem sempre seriam os melhores, mas isso resolvia-se no plebiscito seguinte de forma mecânica]. Nos dias de hoje, é dramático, quase angustiante ouvir e ler determinados candidatos, que mais não são do que a materialização do vazio, ou de formas abstractas do ridículo. Diria que a seita dos idiotas está a propagar-se forma quase viral - abusando da metáfora. E para isso ainda não há profilaxia, nem vacina.