31/01/2021

...assincronia

 

Perante uma situação emergência, como é que vivemos actualmente (tal como sucedeu em Itália, mais tarde em Inglaterra, ainda a decorrer nos Estados Unidos, e noutras paragens) há sempre dois modelos de actuação, cada qual com as suas fragilidades e desafios: salvar o maior número e salvar todos os que podem ser salvos. O segundo modelo congrega o consenso moral, o primeiro é um desígnio alcançável, mas qualquer um deles enferma de um pequeno problema funcional e estrutural: por mais planos que se façam, nada consegue remediar a arbitrariedade da produção e distribuição das vacinas. Não depende de nós.

Simplesmente, não existe sincronia absoluta na cadeia de processamento e a garantia de fornecimento é baseada na expectativa.

Por isso, é normal que casos como os que sucederam esta semana, e que não são um exclusivo nacional (atente-se ao que sucedeu por exemplo no Oregon na passada quinta-feira), vão ser inevitáveis. Toda e qualquer acção por parte das equipas que estão a administrar as vacinas vai sempre depender da tomada de decisão individual, organizacional e ética. Aquilo que se pode questionar (e bem!) é se, faz sentido fornecer uma primeira dose a todos os trabalhadores de uma simples pastelaria e questionar o facto de terem estado naquela hora específica no local certo. Outra questão que deve ser exarada (naquilo que, agora se intitula do foro “criminoso”) é se, não teria sido mais justo indagar outro local nas proximidades com pessoas que estejam dentro dos critérios da 1ª Fase. Certamente que haverá.

Convém notar que, não se pode replicar o mesmo raciocínio à atitude de quem, estando em lugares de chefia pública (ou privada) utiliza essa condição como argumento, para, de forma gravosa, sobrepor-se ao racional que está definido. O enquadramento desses actos, ultrapassa questões éticas ou morais, e cai directamente no âmbito do absurdo premeditado. Isso sim, é matéria passível de ser julgada. E não é uma questão, é um facto.

Para que o modelo funcione, não é possível que todo e qualquer indivíduo mobilize esforços e sobreponha-se ao próximo, de uma forma individualista e egocêntrica. Tudo tem de seguir o seu ritmo- a sincronia absoluta mais do que uma impossibilidade, é uma utopia. Qualquer tentativa reiterada de subverter as regras definidas constituem um clamoroso perigo – a utopia transfigura-se em anarquia.