29/09/2013

...a carga da brigada ligeira

Alguns anacronismos e outras considerações absurdas para deleite da minha reflexão eleitoral.

Amanhã é dia de eleições mas ao contrário de outras lutas fratricidas, desta feita estou com sérias dúvidas se hei-de sucumbir à violoncelista, e embarcar na jangada de pedra que me levará à urna, ou se hei-de contrariar aquela faceta sarcástica do Saramago e deixar-me levar na minha jangada de pedra e deixar que o mar decida o meu destino. A indecisão é a corrosão da razão, mas estou plenamente convicto que no momento em que sentir a textura daqueles três pedaços de papel, a minha pena se encarregará de suportar o fardo da minha indecisão.

Estras foram sem dúvidas as eleições mais tristes que assisti. Não pela actuação primária da CNE que acordou do seu sono quadrienal, mas pelo facto de muitas das candidaturas que apareceram por aí não passarem de pura demonstração de um bairrismo bacoco e de uma profunda e insana demonstração de pobreza de espírito. A certa altura, senti dificuldades em entender se estava num país dito europeu ou numa pseudo democracia latino-americana, tal era a ignorância e o conteúdo da mensagem. Ao contrário do Manchete, a verdadeira podridão não está nas incorrecções factuais, mas no patamar basal que a política portuguesa atingiu. A degradação é tal que ameaça tornar-se num endemismo em toda a cadeia trófica.

Hoje, sábado dia 28, a escassas horas de partir [eu e a minha ink rollerball], escrevo amordaçado com o lápis azul apontado nesta sala escura e húmida, na perspectiva de assistir na primeira linha à desagregação do discurso corrosivo e arrogante que nos tem acalentado o desespero e a revolta. Provavelmente depois das 19:00 assistirei ao primeiro acto desse novo ensaio para o pessimismo, esse reavivar para o tal 2º resgate (buzzword do momento), que nos vai infernizar ainda mais a nossas vidinhas condenadas. Mas a linha foi traçada por esses mesmos que amanhã vão desferir o doubletalk de condenados e carrascos.

Houvesse por aqui uma passarola e seriam esses os primeiros a experimentar os ventos do atlântico até parte incerta. A nós resta-nos a jangada de pedra, o navio do holandês voador, sei lá, na melhor das hipóteses o poço ou o precipício.

Por um lado sinto o alívio de voltar à rotina, e poder sentir o pulso da cidade (ou melhor falta dele) sem aqueles cartazes com ideias vagas e projectos mirabolantes. Já para não referir a caixa do correio cheia de propaganda autárquica reciclável. Até as árvores deixaram de chorar folhas, neste princípio de Outono triste e silencioso, como o nosso PR.

TC. Raro é o dia que os inquilinos do Ratton não se sintam confortados com uma primeira página do jornal de transporte público. Houve um tempo em que provavelmente por falta de expediente ou inépcia partidária, o bar e a sala de fumos deveriam apinhados de becas com tonalidades a mofo. Actualmente acredito piamente que as pizzas fora de horas ou sandes da marmita (não as do Sr. Oliveira e Costa & associados) são os bestsellers do bar do Ratton. É triste dizer isto mas, provavelmente a única forma de sentirmos algum alívio na nossa carga fiscal é atacar os hunos e deixarmo-nos de resmas de papel. Há por aí muito boa gente que pode e deve produzir muitos mais, nem que seja pelo orgulho profissional ou outra virtude ignorada.

Aparentemente devíamos ter entrado esta semana no dito mercado [essa personagem enigmática que ninguém sabe], mas metade da população incluído a coordenadora Catarina, o secretário (in)Seguro e outros ditosos produtores de soundbytes esqueceram-se que em tempo oportuno o nosso Gaspar fez uma operação de troca de Obrigações do Tesouro [eu relembro! 2 de Outubro de 2012], cujo vencimento seria neste mês, tendo passado para Outubro de 2015. É claro que não são obrigados a saber isso, mas estou certo que quando alguns deles chegar ao ponto de sentir o pó nos móveis do Palácio de São Bento, certamente vai ter um exército de jovens assessores [principescamente pagos] para os alertar para a data no livro de fiados. Com ou sem entrada nos mercados, fiquemos então por uma entrada cautelar nas compras online.

Será que a esta hora no telefone do nosso PM já começaram a chegar as primeiras mensagens das distritais, de teor sórdido e refinado calão social-democrata? Afinal de contas, foram deles as palavras de pontapé de saída para o acto eleitoral

«(…)que se lixem as eleições, o que interessa é Portugal!».

A partir de segunda-feira tudo muda, a começar pela linha vermelha do Caldas. Volto depois de escalpelizar os resultados.

Theirs not to reason why
Theirs but to do and die


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